Cezimbra Jacques

JOÃO CEZIMBRA JACQUES

(Santa Maria, 1849 – Rio de Janeiro, 1922)

     João Cezimbra Jacques teve sua carreira dedicada ao militarismo, tendo chegado ao posto de capitão e post mortem à condição de tenente do Exército Brasileira. Foi voluntário na Guerra do Paraguai aos dezoito anos, em 1867, servindo no 2º Regimento de Cavalaria. Precursor do Movimento Tradicionalista Gaúcho.

     Como escritor versou sobre assuntos até então pouco explorados ou inéditos. Por sua inspiração foi criado o Grêmio Gaúcho, núcleo primeiro no culto sistematizado das tradições sul-rio-grandenses; fez parte dos primeiros adeptos do positivismo. Além de considerações a respeito da vida, usos e costumes dos indígenas do seu Estado, registrados em seu Ensaio Sobre os Costumes do Rio Grande do Sul (1883) e em Assuntos do Rio Grande do Sul (1912), escreveu uma pequena monografia intitulada Frases e Vocábulos de Aba Neenga Guarani e Notas Sobre os Silvícolas – afora outros vários títulos sobre questões de história e cultura.

TÍTULOS 

Ensaios sobre os costumes do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Tip. Gundlach, 1883. 154 p. [1ª edição] Santa Maria: Editora da UFSM, 2000. 160 p. [Edição Comemorativa]

Frases e vocábulos de Aba-Neenga Guarani. Porto Alegre: Tip. Gundlach Becker, 1904. 45 p.

Notas sobre os selvícolas. Porto alegre. 1911.

Assuntos do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Tip. Escola de Engenharia, 1912. 249 p.

A proteção ao operariado na república. Rio de Janeiro: Tip. Aurora, 1918. 36. p. (Ensaio)

REFERÊNCIAS CRÍTICAS

BELTRÃO, Romeu. Cezimbra Jacques – “O Sinuelo”, n° 1, agosto de 1953.

___. Cezimbra Jacques e Roque Callage, dois tradicionalistas Santa-marienses – “O Sinuelo”, n° 2, 1960.

FONSECA, Orlando; QUEVEDO, Júlio. Cezimbra Jacques: passado e presente. Porto Alegre: Martins Livreiro, 2000.

KROEFF, Mário. O gaúcho no panorama brasileiro. Rio de Janeiro: [s.n.], 1977.

MARIANTE, Hélio Moro. História do Tradicionalismo Rio-grandense. Porto Alegre: Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, 1976.

SCHILLING, Getúlio. Cezimbra Jacques: o precursor. Porto Alegre: Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, 1986.

SELETA

 IMEMBUÍ

 Índios minuanos, seduzidos pela beleza e  delícias do local, vieram acampar em uma região que chamaram de Iguitorí, “terra da alegria”, em campos onde fica a atual cidade de Santa Maria.

 O cacique da tribo era o valente Japacani, “águia”, que possuía como esposa a bela Ibotiquintã, “botão em flor”. O casal teve uma criança: Imembuí, “filha da água”, assim chamada porque nasceu às margens de um arroio, onde a linda mulher do chefe indígena fora tomara banho.

Mais bonita que a própria mãe, Imembuí cresceu sendo adorada por toda a tribo.

 Passado algum tempo, Japacani, convocado, viajou para encontrar-se com Taguatoberá, “gavião dourado”, respeitado e poderoso cacique da nação minuano, que morava, com seu povo, nas fraldas da Serra de Aceguá, em Bagé, a caminho dos campos do Uruguai.

 Terminado o “Monohonga”, a Assembléia dos Povos Indígenas, Japacani que viera na companhia da mulher e da filha, regressa para cumprir a missão que lhe coubera, pois as tribos preparavam-se para a guerra contra os bandeirantes.

 A tarefa que lhe foi distribuída, consistia em atrair para a causa da união das tribos, o cacique Ibitiruçu, Serraria, dos Tapes, que não se submetera aos padres da Companhia de Jesus.

 Obtida a aliança dos tapes, minuanos e charruas, passaram-se a exercitar na arte da defesa, sob o mando de Icupuiaiara, “senhor das boleadeiras”.

 Mas, no decorrer de tantas caminhadas e reuniões, Imembuí veio a conhecer Acangatu, “boa inteligência”, jovem tape, filho de uma irmã do cacique Ibitiruçu de nome Puicaça Poranga, “pomba formosa”.

 A paixão do jovem tornou-se uma obsessão, entretanto, a bela Imembuí, embora muito amiga, o tratava como irmão, “che quibui”.

 Festejavam os índios os bons fados que os deixavam unidos, quando os paulistas que vinham da Colônia do Sacramento, atraídos pelas fogueiras, danças e ritos, caíram sobre os indígenas.

 Os nativos, mais numerosos e aguerridos, derrotaram os bandeirantes e dos prisioneiros que iam ser levados à morte encontrava-se um jovem branco muito atraente, que imediatamente foi chamado pelas índias de Angaturã, “o belo”.

 Não demorou para que Imembuí e Angaturã se apaixonassem perdidamente. A índia então, teve a coragem de pedir a seu pai que concedesse ao bandeirante a liberdade.

 Reuniu-se a Assembléia dos Guerreiros, e estes, porque tinham muita amizade por Imembuí, concederam a satisfação de seu pedido, sob a condição de que Rodrigo (este era seu verdadeiro nome) deveria acompanhar a tribo. Os jovens, em seguida, casaram-se.

 Acangatu, coitado, quase morreu de paixão, mas como era um homem de bom coração e ainda, vendo que nada mais poderia fazer para conquistar o coração de sua amada, desapareceu dos olhos de todos, embrenhando-se na mata, para nunca mais voltar.

 O jovem branco, “Morotin”, para os índios, foi muito feliz com sua jovem esposa e trabalhou muito para o engrandecimento da tribo. Ele viajou, realizou bons negócios, comprou, trocou e melhorou as condições econômicas dos índios aos quais pertencia sua mulher.

 Passaram-se muitos anos, outra vez, e eis que um dos filhos já de dezoito anos, perdera-se, à noite, dentro da mata, onde foi achado pelo irmão de criação de sua mãe, justamente no momento que um tigre avançava sobre o rapaz.

Voltaram então, o jovem com Acangatu para junto de Imembuí e Morotin.

E foi assim, que todos viveram como bons amigos, até morrerem de velhos…

 E aqui acaba a história de Imembuí, “símbolo de graça”, que foi aquela que reuniu em torno de si àqueles que primeiro povoaram Santa Maria.

(Este texto, que João Belém apresenta como lenda em sua História do Município de Santa Maria (1933), aparece em forma de conto autoral (autodeclaradamente uma criação ficcional)  na obra Assuntos do Rio Grande do Sul (1912), de Cezimbra Jacques).