JOÃO DA SILVA BELÉM
(Porto Alegre, 1874 – Santa Maria, 1935)
João Belém mudou-se, em 1900, para Santa Maria para trabalhar na Compagnie Auxiliaire des Chemis de Fér (Viação Férrea). Foi dramaturgo, historiador, poeta, jornalista, professor e funcionário público. Belém escolheu Santa Maria como sua cidade, aqui casando e tendo seis filhos. Como jornalista, atuou nos jornais O Viajante, O Estado e 14 de Julho, entre outros. Para o teatro escreveu comédias, dramas, operetas e revistas, sendo a maioria das produções encenadas em Santa Maria. Belém ingressou na Academia Rio-Grandense de Letras, participou da fundação do Instituto Geográfico e Histórico do Rio Grande do Sul e foi professor em algumas escolas de sua cidade adotiva. Em 1935, morre aos 61 anos deixando considerável produção bibliográfica, merecendo destaque especial a obra História do Município de Santa Maria – 1797/1933, publicada em 1933 e reeditada pela Editora da UFSM em 1989.
TÍTULOS
POEMAS, CRÔNICAS, MEMÓRIA E HISTÓRIA
Aerólitos (Porto Alegre, 1891)
Páginas Perdidas (Porto Alegre: Globo, 1916)
Musa Ferina (s.d.)
Santa Maria Pitoresca (s.d.)
História do Município de Santa Maria – 1797/1933 (Santa Maria, 1933)
TEATRO
Comédia
Notas falsas ( Santa Maria, 1902)
O Filho do Momo (Santa Maria, s.d.)
O peixão (Santa Maria, s.d.)
Satanás em Santa Maria (Santa Maria, s.d.)
Fitas de Centenário (Santa Maria, s.d.)
Rio Grande pitoresco (Santa Maria, s.d.)
Primavera (Santa Maria, s.d.)
Drama
Regeneração (Santa Maria, s.d.)
Corações Gaúchos (Santa Maria, s.d.)
Operetas
Gatuno do Amor (Santa Maria, s.d.)
A Professorinha e a Comédia da Vida (Santa Maria, s.d.)
REFERÊNCIAS CRÍTICAS
BIASOLI, Vitor. Maçonaria versus Igreja Católica: o caso do periódico Reação em Santa Maria (1915–1917). In: ANAIS do XXIV Seminário Nacional de História. São Leopoldo: Anpuh, 2007.
CARDOSO, Edmundo. João Belém (1874-1935) – Resumo Biográfico. In: BELÉM, João. História do Município de Santa Maria – 1797-1933. Reedição. Santa Maria: UFSM, 1989.
GOULART, Tiago. ROSA, Rosana. WEBER, Beatriz T. A historiografia como questão histórica: as obras de João Belém e Romeu Beltrão na construção da história de Santa Maria. Sociais e Humanas: Revista do Centro de Ciências Sociais e Humanas da UFSM, Santa Maria, v. 17, 2004.
MARCHIORI, José Newton Cardoso. João Belém – Intelectual Santa-mariense. In: BELÉM, João. Três Peças Teatrais. Santa Maria: Câmara Municipal de Vereadores, 2002, p. 13-22.
VILLAS-BÔAS, Pedro. Notas de Bibliografia Sul-rio-grandense: autores. Porto Alegre: A Nação, Instituto Nacional do Livro, 1974.
SELETA
Mimi não era gatinho, era uma menina. Os doze anos de Mimi eram […] doze risonhas primaveras, mas verdadeiramente risonhas porque ela nunca sofrera um pesar que lhe fizesse chorar […]. Pois, caros leitores, essa cândida menina, esse beijo de alvorada, esse riso do luar […] foi um dia levada à igreja para se confessar, isto é, para que um padre a confessasse. E o padre, sem que um benemérito corisco o fulminasse, teve a suprema covardia de consentir que aquela criança, isenta de qualquer pecado, se ajoelhasse aos pés dele, velho pecador […]. Que faltas graves pode ter praticado uma menina de 12 anos para ir, por intermédio de um confessor, pedir perdão a Deus? (BELÉM, 1915, p. 2)
(BELÉM, João. Coriscos… In: Reação – Órgão das idéias liberais, Santa Maria, ano I, 01 maio 1915).
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Tais índios catequizados, agricultores uns, operários outros, todos obedientes à religião católica que professavam com ardente fé, identificaram-se com o meio ambiente, aceitando sem constrangimento os costumes da população que os agasalhava. […] estavam integrados na coletividade santa-mariense em razão do que, com o tempo, desapareceram na fusão do sangue gaúcho pelo cruzamento das duas raças que se encontraram ( p. 31). […] eram indivíduos que, em virtude da catequese […], estavam civilizados, tendo abraçado com sinceridade a religião católica. […] em nosso trabalho, entretanto, pouco nos interessa saber a que raça ou sub-raça pertenceram…
(BELÉM João. História do Município de Santa Maria – 1797-1933. Santa Maria: UFSM, 1989, p. 89-90). [publicação original de 1933]
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Acordada em sobressalto a pacífica população do bairro em que está situado aquele imóvel do Estado [quartel da Brigada Militar], cada qual tratou de forrar, pelo lado interior, as frágeis paredes de sua casa de madeira, para que não fosse fuzilado por balas perdidas, dentro de sua própria habitação. Três horas durou a fuzilaria intensa, levando o desassossego a todos os lares, pois que toda população acordou. E, com o coração nas mãos, assistia, com a imaginação, o desenrolar da pavorosa tragédia que seus olhos não viam, mas que o estampido das armas de guerra lhe fazia chegar aos ouvidos, em proporção talvez maior do que era. Mas, de fato, a tragédia era horrível. (p. 245). […] “Diversas pessoas recolheram-se ao quartel do 7º Regimento de Infantaria temendo que os revolucionários pudessem tomar conta da cidade e molestá-las” [citação do jornal “Diário do Interior” que ele insere no texto.] Este sangue derramado, estupidamente, em frente ao quartel da Brigada Militar em Santa Maria, foi o último vertido na revolução de 23.
(História do Município de Santa Maria, 1989, p. 246)
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VELHA JOANA (voz trêmula): Uma vaquinha que eu tinha para dar leite à minha netinha… Uma vaquinha só que eu tinha e os soldados levaram! Mande soltar a minha vaquinha, seu capitão! Minha filha, já não tem marido, morreu na revolução… e a netinha morrerá também se não lhe der leite… é tão fraquinha… nós já não temos o que comer… Levando esse último animalzinho que temos, ficamos na miséria. Não é de mim que eu peço que tenhas pena, é da minha netinha, é de uma criancinha de 2 anos, órfã de pai. […]
SARGENTO (risonho): É tempo perdido, tenente, a vaquinha desta bruxa já foi carneada, estava gorda que era um gosto. Em todo caso ela pode levar o couro… já não perde tudo…
ARTHUR (reprimindo a indignação): Tem razão! Não perde tudo como você já perdeu até o sentimento humano. Entre um irracional e você, o irracional tem mais alma! Retire-se da minha presença! (sargento retira-se).
VELHA JOANA (retirando-se): Pobre da minha netinha, vai morrer à míngua.
ARTHUR (indignado): E é em nome do povo que se fazem as revoluções! Em nome do povo como se não fosse o povo, a massa anônima, que mais sofre as terríveis conseqüências.
(Segundo Ato de Corações Gaúchos. Três Peças Teatrais. Santa Maria: Câmara Municipal de Vereadores, 2002, p. 176-177)